Em Defesa de O Exorcista II: O Herege

O Exorcista estreou nos cinemas em 1973 e estabeleceu um legado imediato. Hoje, mais de meio século após seu lançamento, histórias de espectadores vomitando e desmaiando no cinema ainda são comuns. Linda Blair, que interpretou a criança possuída Regan McNeil, tornou-se instantaneamente um ícone do terror. Enquetes com críticos frequentemente apontam O Exorcista como o Filme Mais Assustador de Todos os Tempos. Sem mencionar que o filme se tornou o mais lucrativo daquele ano. Naturalmente, o estúdio Warner Bros. ansiava por uma sequência, conseguindo uma com O Exorcista II: O Herege em 1977.

Exorcista

Não é preciso dizer que O Exorcista II: O Herege teve uma recepção muito diferente de seu predecessor demoníaco. Apesar de um elenco de lendas da atuação e vencedores do Oscar dos dois lados da câmera, incluindo o diretor de Amargo Pesadelo e Excalibur John Boorman no comando, a sequência se tornou instantaneamente motivo de piadas. Os críticos massacraram o filme como uma nuvem de gafanhotos frenéticos, e apesar de ter defensores estranhos, O Exorcista II: O Herege permanece algo como uma piada até hoje. Quase 50 anos depois, uma reputação demoníaca como essa para um filme nos faz pensar: será que ele é realmente tão ruim? Surpreendentemente, não realmente.

O Exorcista II: O Herege é um Desastre Narrativo

O Filme é Sobrecarregado por uma Trama Confusa e Temas Confusos

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Quatro anos após os eventos de O Exorcista, Regan McNeil (Linda Blair) retornou à vida normal de adolescente sob os olhares atentos de sua babá, Sharon (Kitty Winn). O Vaticano, no entanto, tem perguntas sobre seu exorcismo e abre uma investigação sobre o Padre Merrin (Max Von Sydow), o bondoso padre que morreu durante o ritual. Em um dos momentos mais intrigantes do filme, Padre Karras – interpretado por Jason Miller e o provável protagonista de O Exorcista – nem sequer é mencionado. Parece que Merrin escreveu alguns pensamentos controversos sobre a natureza da igreja, do bem e do mal. A liderança da igreja designa o Padre Lamont (Richard Burton), um padre atormentado com seu próprio histórico de realizar exorcismos, para entrevistar Regan e investigar a morte de Merrin.

Lamont chega em Nova York e se encontra com a psiquiatra de Regan, Dra. Tuskin (Louise Fletcher), que acredita que Regan ainda esconde alguma parte de seu trauma em seu subconsciente. Tuskin usa um “sincronizador” de hipnose para ligar as mentes de Lamont e Regan. O processo revela que o demônio Pazuzu ainda habita dentro dela, e Lamont tem uma visão de um jovem Padre Merrin exorcizando o demônio de um jovem menino na África. Lamont se convence de que o menino possui a chave para entender e derrotar Pazuzu de uma vez por todas.

Ou algo assim. O Exorcista II: O Herege luta com a coerência narrativa em todo o filme. O diretor Boorman, trabalhando com os escritores William Goodhart e Rospo Pallenberg, reescreveu o roteiro enquanto filmava, resultando em uma estranha mistura de ideias. Blair mais tarde afirmaria que o roteiro inicial de Goodheart, que se concentrava na ideia de que o bem e o mal travam uma batalha através da consciência humana, na verdade tinha algumas ideias provocativas, mas essas foram massacradas durante as filmagens. Boorman também insistiu em incorporar várias sequências de Regan dançando sapateado na história – algo que os espectadores mais tarde consideraram absurdo.

O Exorcista II: O Herege dança fora dos trilhos e nunca se recupera

O Filme é Muito Bizarro e Involuntariamente Bobo para Ser Levado a Sério

Na verdade, tanto as cenas de sapateado quanto as cenas do sincronizador hipnótico se qualificam como algumas das piores já registradas em película. O sapateado parece muito mais bizarro do que qualquer coisa que O Exorcista II: O Herege tenha a dizer sobre demônios, possessão, profecia ou batalhas cósmicas entre Deus e o diabo. Além disso, elas não servem a nenhuma função narrativa. Quando Blair sapateia, Boorman a fotografa em close-up, mostrando à audiência apenas seu rosto sorridente. Essa abordagem levanta duas questões: primeiro, por que forçar Blair a sapatear se o público nunca vê seus passos? E segundo, por que nada de consequente acontece nessas tomadas?

O mesmo vale para as cenas de sincronização. Boorman mostra seus atores – Fletcher, Blair, Burton – em close-up, com os olhos arregalados, as bocas abertas, mas com praticamente nenhuma ação acontecendo na tela. E ainda assim, as sequências continuam, e continuam, e continuam, perturbando todo o ritmo da sequência e matando qualquer ímpeto dramático que ela tinha. Talvez por causa das constantes reescritas, as ideias do roteirista Goodhart sobre a mente ser um campo de batalha entre o bem e o mal nunca se encaixam completamente. Em vez disso, Boorman deixa seu elenco à deriva em uma história desconexa que não tem espinha dorsal.

Exorcista II: O Herege Apresenta Performances Horrendas

O Filme Mancha Grandes Atores

Falando do elenco, O Exorcista II: O Herege não segue seu antecessor em facilitar performances dignas de Oscar entre seus atores. Blair, que, na verdade, teve apenas um papel de apoio no original, ainda tem o carisma que a tornou uma estrela. A sequência a apresenta como uma jovem em ascensão, com pele luminosa e olhos brilhantes. A câmera ainda a adora, e ela ainda mostra potencial como atriz dramática. O resto do filme, no entanto, faz pouco para apoiá-la, e em sequências tão bobas quanto as de sapateado, sincronizador, ou aquela apresentando-a como uma doppelgänger demoníaca, Blair não consegue deixar de parecer apenas ridícula. Ainda assim, ela consegue se sair bem contra Richard Burton, um dos grandes atores do século XX. Isso diz algo positivo sobre ela.

Burton, é claro, já apareceu em filmes melhores e fez performances muito melhores. Histórias do set retratavam o ator vivendo em um estado de embriaguez, e sua atuação em O Exorcista II faz pouco para dissipar esse rumor. Em outros filmes – Quem Tem Medo de Virginia Woolf, por exemplo – o olhar inabalável de Burton, suando e ofegante, dava uma intensidade poderosa ao seu personagem. Aqui, seu trabalho parece exagerado. O fato de Boorman também sobrecarregá-lo com nomes que soarão bobos para o público não ajuda. Ver Burton grunhir “Pazuzu” e “Kokumo” enquanto cambaleia diante da câmera não acrescenta nada de horror em O Exorcista II: O Herege. Por outro lado, pode horrorizar o público perceber que o mesmo ator que deu performances incríveis em Virginia Woolf ou Equus poderia cair tão baixo em um lixo como esse.

O resto do elenco não se saiu muito melhor. Fletcher, que acabara de ganhar um Oscar por Um Estranho no Ninho, talvez tenha querido evitar interpretar um médico tão cedo. Wynn, tão autêntico e credível em O Exorcista, parece um refugiado de uma novela ruim. Von Sydow, em uma breve reprise de seu papel, parece mais um ator envergonhado do que um defensor piedoso de todas as coisas Sagradas. Na verdade, o único membro do elenco de O Exorcista II: O Herege que ainda está de pé quando os créditos rolam é James Earl Jones. Ele aparece como o adulto Kokumo, agora um gentil médico pesquisando gafanhotos. Em uma das cenas mais loucas do filme, Burton enfrenta o personagem de Jones, que aparece em uma fantasia gigante de gafanhoto e – sem brincadeira – cospe um leopardo no padre combatido. A capacidade de Jones de interpretar a cena com seriedade e não ser sugado pelo ridículo testemunha seu poder como ator.

O Exorcista II: O Herege Tem Alguns Tesouros Esquecidos

O Filme Surpreendentemente Parece Tão Bom Quanto o Original

No entanto, apesar de toda a atuação absurda, escolhas de direção ridículas e história confusa, O Exorcista II: O Herege ainda possui algumas forças notáveis. Boorman empresta à sequência um estilo visual forte. A abertura, ambientada em uma igreja na América Latina em que uma mulher possuída se imola, evoca um verdadeiro horror. O próprio cenário, repleto de relíquias religiosas assustadoras e iluminado por velas, evoca os sentimentos primordiais de bem e mal da religião que o resto do filme tanto carece. Outra sequência, ambientada em uma igreja construída em um penhasco na selva africana, também banha a audiência em esplendor visual e sugere a tonalidade bergmaniana que Boorman pode ter desejado para o resto do filme.

O Exorcista II: O Herege também apresenta maquiagem e efeitos especiais de primeira linha. Dick Smith, o mestre da maquiagem que desenvolveu as técnicas inovadoras do primeiro filme, mostra suas habilidades novamente aqui. Personagens que são queimados vivos possuem uma credibilidade particular. As cenas do sincronizador, embora absurdas, apresentam efeitos impressionantes feitos dentro da câmera, nos quais os personagens parecem se transformar uns nos outros. O ato final apresenta enxames de gafanhotos destruindo uma casa em Georgetown, e apesar da tolice da imagem, parece bastante real, mesmo pelos padrões modernos. Outra sequência, que mostra o personagem de Burton literalmente montando nas costas de um gafanhoto, tem uma qualidade surreal e psicodélica que injeta energia na trama.

Exorcista II: O Herege é Melhor na Teoria do Que na Prática

O Filme Faz um Bom Argumento para Não Fazer Sequências de O Exorcista

Parece que Boorman queria canalizar esse tipo de loucura de sonho febril ao longo de toda Exorcista II: O Herege, mas ficou aquém de seus objetivos ambiciosos. A visão louca de Boorman só funciona realmente aos trancos e barrancos, mas quando funciona, a qualidade alucinógena evoca o clima de medo que o diretor quer evocar. Boorman disse que queria fazer um filme sobre como a natureza do bem atrai o mal, e como essas duas forças podem enlouquecer uma pessoa. Assistir Exorcista II: O Herege é o suficiente para fazer qualquer pessoa se sentir louca. Se não for tentando entender a história maluca, com certeza deixará os espectadores loucos ao tentar descobrir o que diabos Boorman pretendia com esse filme desde o início!

E isso pode se qualificar como o maior defeito de Exorcista II: O Herege: nenhum sequência realmente poderia continuar a história de O Exorcista. Tanto o diretor de O Exorcista, William Friedkin, quanto o autor do livro, William Peter Blatty, tentaram pensar em ideias para sequências, mas nunca conseguiram desenvolver uma premissa que valesse a pena. Blatty mais tarde escreveria vários romances que ele considerava semi-sequências e sucessores espirituais (um dos quais se tornou a base para Exorcista IIIO Exorcista. Como evidenciado pelo recente Exorcista: Crente, talvez nenhuma sequência do filme original pudesse funcionar. A premissa de filmes sobre exorcismos é muito limitada, e é simplesmente impossível — e discutivelmente imprudente — tentar fazer uma sequência de um clássico cinematográfico incontestável como O Exorcista.

O Exorcista II: O Herege certamente não funciona como uma sequência ou um filme independente, mas, de certa forma, a sequência tem qualidades cativantes. Ela não alcança exatamente o acampamento hilariante não intencional de Showgirls ou Valley of the Dolls, mas no cenário cinematográfico atual de sequências competentes, porém seguras e sem graça, reboots, spin-offs e reprises, a criatividade e imaginação arrojadas de O Exorcista II: O Herege fazem dele uma experiência fascinante. O crítico de cinema John Powers uma vez o chamou de “o Cidadão Kane do lixo” – em outras palavras, uma obra de incrível criatividade, exceto no nível em que alguém realmente gostaria de um filme. Essa designação faz sentido. Nenhuma pessoa racional poderia chamar O Exorcista II: O Herege de um “bom” filme, mas ninguém poderia chamá-lo de esquecível também. Assistir a um diretor tentar algo selvagem e diferente, mesmo que fracassem, despertará mais interesse do que qualquer filme decente, porém medíocre e esquecível, poderia. Chame essa sequência em particular de um desastre, mas não a chame de entediante.

O Exorcista II: O Herege agora está disponível para assistir e possuir fisicamente e digitalmente.

Via CBR. Veja os últimos artigos sobre Filmes.

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Rob Nerd
Rob Nerd

Sou um redator apaixonado pela cultura pop e espero entregar conteúdo atual e de qualidade saído diretamente da gringa. Obrigado por me acompanhar!